A nossa definição de amor vai-se alterando à medida que vamos
crescendo e nos tornando mais maduros. É como se precisássemos passar por
vários estágios do amor, para alcançar o amor maior, o amor verdadeiro, aquele
pelo qual valeria a pena virar o mundo do avesso. Os estágios são três, geralmente.
O amor não-correspondido na pré-adolescência. O amor tóxico pelo meio e o fim
da adolescência. E o amor verdadeiro no inicio da idade adulta.
Quando somos novos, somos facilmente enganados pelo coração.
Acreditamos que o mínimo gesto de carinho já pode ser amor, e deixamo-nos
consumir por essa ilusão. Às vezes, o amor nem tampouco é correspondido, mas
idolatramos o outro como se a nossa vida dependesse disso.
Na verdade, esse tipo de amor é dos mais bonitos, amámos sem
esperarmos ser amados de volta, e nada é mais puro do que um amor que dá sem
querer receber.
Mas depois, vamos crescendo e percebendo que aquilo nem era
amor, sequer. Era qualquer espécie de sentimento bonito que germinou dentro de
nós, mas não tinha a total forma do amor.
Então, alguém chega e nos faz ver o mundo por outra perspetiva,
através dos seus olhos. Caímos na tentação de sermos diferentes, de mudarmos
para agradar ao outro, cruzamos linhas delicadas, caminhamos por estradas
forjadas a ferro quente, permitimos que o outro nos faça o peito em dois,
consumindo até a nossa auto estima.
Esse é o amor tóxico. O amor que nos impulsiona a voar, para
nos roubar as asas e deixar cair logo depois. O outro lucra com a nossa dor. Gosta
de nos ver definhar, de nos ter na mão, de nos usar a bel-prazer.
O amor tóxico é doloroso, cruel. Arruína as nossas músicas
preferidas. Faz-nos colocar dois dedos na garganta, na esperança de vomitarmos
a mágoa que nos vai torturando por dentro. Corta-nos as pernas. Torna-nos
dependentes.
É um amor que mistura o perigo e o desejo, parece até ser
tudo o que idealizávamos. Há algo de poético em morrer por amor, é por isso,
que todos gostamos de viver um amor tão inconstante. Certamente, um amor assim
renderá as músicas top's das tabelas, livros que são best-sellers imediatos, e
filmes que esgotam bilheteiras. Isto, porque são a melhor forma de amor impossível.
Torna-se um ciclo vicioso do qual queremos fugir, só não o fazemos pelos
momentos bons, pela aventura e pela adrenalina que este amor nos proporciona, mas
é sabido que não se pode ter sol na eira e chuva no nabal.
Choramos tanto, que a dado momento, achamos que aquilo é tudo
o que conseguiremos da vida; um amor sofrido, que nos faz penar, e repudiar a
sua existência, na mesma medida, em que nos excita sempre que nos toca. Mas um
amor tóxico não é um amor para ser vivido a tempo integral. Podemos sofrer
durante anos até que a vida nos desperte para a realidade. Porém, sempre
acordamos, ainda que tarde. Porque por mais poético e bonito que pareça, é a
cena mais fodida de sempre. Deixa-nos com marcas corpo a baixo, e feridas
emocionais que vão latejar nos dias mais frios.
Depois, num dia como outro qualquer, em que já não esperamos
por nada, chega ele, por fim. O amor maior. O verdadeiro. Aquele que se molda a
nós para se encaixar no nosso peito. Um amor que nos traz paz, calmaria… Que
ensina o nosso coração a confiar e a ser paciente. Que nos ensina a ter fé e a depositar
esperança em dias melhores.
O amor maior chega sempre sem aviso prévio, e é mágico! Tem a
capacidade de nos fazer acreditar de novo em finais felizes. Devolve-nos a
liberdade. Devolve-nos o sorriso. Ensina-nos a sonhar outra vez. Faz-nos voar e
segura-nos sempre, o mais que pode. Cura as feridas, arruma o lixo do passado,
e deixa-nos espaço para sentir novamente apenas coisas boas. Somente nos faz chorar
se for de felicidade.
Este amor rende-nos os poemas mais bonitos e sinceros. Não nos
dá apenas as estrelas, dá-nos toda a imensidão do céu. É o amor certo. O amor
pelo qual vale a pena enfrentar os nossos medos e demónios. Na verdade, é o
amor mais corajoso que nos habita. É um amor seguro, que nos protege, que nos
sacia, que nos ensina e que nos faz alguém melhor.
É assim que se sabe que encontramos o amor verdadeiro,
quando queremos melhorar. Não apenas mudar, mas melhorar. Qualquer pessoa que
nos torne melhores é uma pessoa que devemos manter na nossa vida.
Percebemos que até então, tínhamos falhado em todas as definições
de amor. Mas uma certeza teremos sempre, é preciso passar por todos os níveis,
para vencer o jogo. É preciso perder algumas vezes, desistir até de jogar, para
sermos capazes de ultrapassar todas as fases dolorosas, de modo, a alcançarmos
o amor definitivo.
A caminhada não é, de todo, em vão. Embora, em diversos momentos,
nos pareça descabida, é o caminho que nos leva ao destino que nem imaginávamos que
era nosso.
O amor vale a pena. Todas as suas estradas tortuosas e
inusitadas. Todas as lombas e cicatrizes que nos vai deixando. O amor vale a
pena. Vale a pena ser vivido na sua plenitude. Pode tardar, mas sempre chega. Sempre.
Letícia Brito
1 Comentários
Maravilhoso, cara Letícia. O amor é isso mesmo, um estado de espírito, um fator de crescimento pessoal, um elo que criamos e reforçamos com outra parte com vista a construir algo de positivo, algo que nos transforme num ser melhor, seja em que plano for. O amor leva-nos a dar a mão a algo ou a alguém, e, se o alimentarmos da forma certa dentro de nós, as mãos apertam-se e, então, o amor acenda a chama que acorda aquele sorriso singelo e sincero que andava perdido dentro nós. Sorriso como este, ninguém derruba nem nada a abala, pois, foi moldado por nós, com o que está em nós e, portanto, fica enraizado em nós, e é imune a todo o rebuliço que possa circular à nosso volta. Amor assim abre portas. Cumprimentos, cara amiga.
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