Jorge, sê bem-vindo a este espaço. É um gosto poder conhecer-te melhor e apresentar-te aos seguidores deste espaço, para começar: Como é que te iniciaste na escrita?
Qual o sentimento que te domina quando escreves?
Para mim, escrever vai para além de expressar ideias em texto, é traduzir sentimentos em palavras, criando textos e enredos capazes de despertar emoções fortes em quem os lê. Sempre que escrevo, tento despertar emoções fortes dentro de mim, para que as palavras que vou usando na criação de textos e enredos traduzam essas emoções e sejam fortes o suficiente para causarem impacte e terem significado nos leitores. O sentimento que me domina quando escrevo é a força de querer transcender, que as minhas palavras consigam saltar dos textos, entrar em quem as lê e, se possível, tornarem-se substância viva.

O que é que a escrita mudou em ti, enquanto pessoa?
A escrita tem sido a minha vida, nunca deixou de me acompanhar, tem alimentado os meus pensamentos e gerido parte do meu percurso de vida. Desejei escrever desde muito cedo, comecei a fazê-lo aos onze anos e nunca mais parei. Já perdi a conta aos esboços de histórias que criei, inspiradas em mim e em outros, do que vivo, do que vejo e do que leio. Guardo em mim uma amálgama infindável de ideias que espero vir a transpor em textos para publicação, mas a literatura é uma ocupação sem prazo, tão perpétua quanto o tempo de vida de quem se entrega aos prazeres da escrita; haverá sempre tempo para escrever mais um enredo. O fato de querer escrever levou-me a ler. Através da leitura, descobri realidades até então incompreensíveis e desconhecidas para mim, mostrando-me que o Mundo é mais diverso e misterioso do que eu alguma vez poderia imaginar. Pensar sobre o Mundo, sobre a vida, a nossa e a de outros, encarar a diversidade humana e cultural de todo o planeta, é certo de que muda quem nós somos, como também muda a forma como vemos os outros e o Mundo, e vou transpondo tudo isto nos meus textos. Com tudo quanto aprendi sobre a vida e sobre a humanidade, em toda a sua diversidade e complexidade, nunca tenho a noção efetiva de estar certo ou errado sobre qualquer tema que traduzo em palavras, pois, não há verdades absolutas nem realidades exclusivas, a verdade e a realidade de cada um é feita à medida do ambiente que o envolve, entre os milhares de ambientes diferentes que vigoram pelos diferentes contextos socioculturais espalhados pela Terra. Com a escrita e com a leitura vou mudando constantemente, pois são fatores que promovem a reflexão e, sempre que refletimos sobre algo, mudamos alguma coisa em nós. Mudo sempre um pouco, ao fim de cada livro que escrevo, ao fim de cada livro que leio, e mudo sempre para melhor. Escrever não deixa de ser um ato de reflexão e de construção, ponderar sobre ideias e trabalhá-las nos enredos das histórias que se vai escrevendo.

E enquanto escritor, o que tens aprendido?
Escrever é um trabalho árduo e complexo. À medida que vou escrevendo, vou mudando um pouco a minha forma de escrever, seja procurando conferir uma maior fluência aos meus textos, seja aumentando a preocupação em detetar falhas no meu processo de escrita, muitas delas promovidas pela escrita digital, seja melhorando a qualidade gramatical dos meus textos, por vezes recriando opções gramaticais, certas ou erradas, é um desafio e um risco que todo o escritor tem de fazer, foi assim que evoluiu a escrita. A realidade é que as questões gramaticais não são fáceis de trabalhar para um escritor de romance, e muito menos para um poeta, que joga com a sonoridade dos textos, procurando a melodia certa para cativar os leitores. No fundo, sei que, com o tempo, a qualidade dos meus textos tenderá a melhorar. Um escritor cresce há medida que vai escrevendo. Escrever bem é o maior desafio que se coloca a um escritor, nomeadamente a um escritor como eu, sem formação superior em línguas.
Relativamente aos conteúdos com que trabalho, também não paro de aprender com eles. Pois, ao escrever, tenho a preocupação de transmitir conhecimento, e para o transmitir, tenho de adquiri-lo antes, documentando-me e estudando algo sobre ele. Ao escrever, tento respeitar a realidade, fundamentando com ela. Estou sempre à procura de substrato que suporte os meus enredos, o que me leva a dedicar algum tempo à investigação e à descoberta, e com isso, aprendo muito.

Como definirias a escrita na tua vida: um passatempo, uma necessidade ou um acaso?
A escrita, para mim, é mesmo uma necessidade. Sempre fui um sonhador, um criador de histórias, um saco de ideias, uma esponja de conhecimento; um criador de mundos que quer dar a conhecê-los a outros. Os enredos para histórias que vou criando geram um turbilhão de ideias em mim que, por vezes, vejo-me a trabalhar mentalmente várias histórias em simultâneo. Já lá vai o tempo em que pegava em blocos de notas para tirar apontamentos, nos quais reuni muito mais de uma centena de esboços de histórias. Atualmente, já não me dou a esse trabalho. Crio as histórias, mantenho-as e trabalho-as na mente, e logo que posso, transponho-as para texto. Tenho sempre em mente esboços de histórias passados que pretendo vir a escrever, trabalho-as dia a dia, enriquecendo-as com novos estímulos que possam dar uma boa dinâmica aos enredos. Posso dizer que a escrita acompanha-me sempre, quer nos pensamentos do dia, quer nos sonhos da noite.

Formaste-te em Biologia. Foste professor do ensino básico e secundário. Estas áreas tão distintas tiveram algum impacto na tua escrita?
Obviamente. Tudo na minha vida influencia o meu pensamento, molda as minhas emoções e interfere com o que eu escrevo. Conteúdos científicos relacionados com a minha área de formação académica, a Biologia, marcam presença nas minhas histórias; a pedagogia também está patente em todos os meus romances, a ler aprende-se muito sobre os aspetos positivos e negativos da vida. Ao sermos alertados para eles, poderemos fazer melhor as nossas opções de vida e evitar muitos dissabores, ainda por cima num Mundo em que se forma uma humanidade cada vez mais amorfa, onde o egoísmo se sobrepõe ao bem comum e as pessoas agem por impulso, sem reflexão prévia e sem respeito pelos mais básicos valores humanos. Talvez o pouco tempo que as pessoas dediquem à leitura esteja relacionado com isso. Por isso, mal ou bem, procuro promover e incentivar o gosto pela leitura, como veículo de transmissão informação e ferramenta para formação. A leitura promove a introspeção, será o leitor a avaliar diversos pontos de vista e optar por aquele que melhor se adapta a si, livrando-se de ter de acreditar em tudo quanto lhe impingem ou ir para onde o empurram. Enquanto escrever, nunca deixarei de procurar ensinar, valorizando a pedagogia nos meus textos.

Começaste pela edição de obras dedicadas ao público mais jovem. Podes falar-nos dessas mesmas obras?
A realidade é que comecei a escrever romances de ficção-científica para adultos. Alguns dos romances que irei escrever nos próximos anos serão fruto dessa leva.          Só quando me vi no lugar de leitor de contos infantis para crianças, é que percebi a importância deste tipo de obras para valorizar a formação de jovens. Produzi, então, um conjunto de esboços para contos infantis pedagógicos, inspirados em acontecimentos reais e em outras histórias infantis que li, procurando trabalhar enredos de valor que fossem úteis na formação pessoal e social de jovens leitores. É possível que ainda venha a escrever uma leva de contos infantis pedagógicos que tenho em esboço.

O que te levou a escrever para este público?
Essencialmente a preocupação com o tipo de leitura consumida pelos jovens de hoje. Muitos deles optam por tipos de literatura que não preconizam valores, não fornecem sabedoria nem preparam para a vida. Aspetos que são cada vez mais importantes integrar na formação de jovens, pois, os conteúdos que eles procuram nos meios audiovisuais, o entretenimento que mais os ocupa atualmente, são pobres em valores e sabedoria, um vazio que conduz à passividade da mente; pelo lado oposto, há conteúdos multimédia, como os videojogos, aos quais os jovens dedicam muito tempo, que hiperativam a mente, mas são tudo estímulos que conduzem à impulsividade e violência irrefletida. Escrevi livros para jovens com intuito de os formar, torná-los mais sábios, mais espertos e mais capazes de serem bem-sucedidos nos desafios da vida, cada vez mais incerta com as sociedades descaracterizadas que a humanidade tem preconizado nas últimas décadas.

Foste coautor de uma obra de carácter biográfico. O que é que essa experiência trouxe à tua escrita?
Trabalhei num projeto que envolveu pesquisa biográfica de cientistas prestigiados da história da Botânica em Portugal, nomeadamente botânicos da Universidade de Coimbra. Produzi resumos biográficos de diversos cientistas que me obrigaram a realizar pesquisas biográficas para completar o puzzle dos respetivos percursos de vida. Esta experiência contribuiu para que eu desenvolvesse um pouco mais as minhas competências literárias, como também ganhasse ainda mais gosto por trabalhar personagens em literatura. Na altura, já me dedicava à escrita, produzindo esboços para as histórias que planeio escrever, que se centravam em retratar vidas de gente real em enredos de ficção criados por mim. Desde então, centrei-me em tentar criar personagens mais reais, mais humanas, ligadas ao sentido da vida. Tudo a atividade que envolva escrita contribui para o crescimento de um autor.



Atualmente estás dedicado à publicação na Amazon. Só este ano já lançaste duas obras de cariz erótico, vertente que em nada se compara aquelas que escolheste anteriormente. O que te motivou a escrever nesse género?
Os primeiros esboços que fiz para histórias de romance envolviam erotismo. Foram histórias pensadas para leitores adultos, consumidores de thrillers e histórias envolvendo amor e sexo. O meu projeto para autor de romances começou assim. Contudo, o erotismo não é parte central das minhas histórias, mas sim um complemento, onde procuro dar expressão a necessidades humanas, como o amor e o sexo, que qualquer pessoa procura, seja na vida real ou nos mais variados meios fictícios de entretenimento, entre os quais se encontra a leitura.
Sempre que leio um romance, ou me sinto preenchido, quando ele retrata todas as vertentes e peripécias do quotidiano da vida humana, tal e qual ela é, com as suas virtudes e os seus vícios, algo que toque o genuíno; ou sinto vazios, quando ele omite certas partes. Eu considero-me um escritor de romance que gosta de retratar a vida real, e é isso que quero que os leitores sintam, ao lerem os meus romances, que aquelas personagens que eu trabalho em textos, podem muito bem ser gente com quem se venham a cruzar na rua no dia a dia. Eu gosto de trabalhar com emoções e despertar emoções em quem lê. Para mim, escrever uma história de amor sem envolver alguns momentos eróticos, mesmo que retratados subtilmente, rouba força e carisma às personagens, pois, acaba por camuflar ou escamotear a realidade, remetendo-as para meras figuras fictícias. E o certo é de que muitos leitores agradam-se ao lerem momentos eróticos em romances, torna a experiência literária mais estimulante, mais sentida e mais real. Quem não gosta de ler romances que o chamem para o mundo real, tal e qual como ele é?

Como foi a reação dos leitores face a este novo lado do escritor?
O tempo o dirá. Cá estarei para avaliar isso. Neste momento, estou envolvido num processo literária intensivo, para publicar um conjunto de romances que tenho em mente, alguns deles em esboço há muitos anos. Quanto tiver publicado um conjunto de obras literárias mais consistente e estiver mais liberto para olhar em volta, logo avaliarei isso. Um autor constrói-se com o tempo, escrevendo momento a momento, até que a sua realidade ou fantasias deem nas vistas e chamem a atenção do universo literário para ele. Como escritor, gosto de surpreender. Espero que os leitores se surpreendam com os meus textos e me surpreendam a mim, mostrando agrado por eles.

Se, no entanto, tivesses de escrever num género diferente daqueles que já experimentaste, a qual desafio te proporias?
Eu tenho vários projetos literários em mente, mas, os que mais me aliciam são o romance de ficção e a poesia. Neste momento, encontro-me a escrever um romance de ficção científica e, posteriormente, irei trabalhar uma obra poética, que já tenho delineada, entregar-me-ei a ela a seu tempo.

Se só pudesses ler apenas um único livro para o resto da tua vida, qual seria o privilegiado?
Esta é a pergunta mais ingrata que pode fazer-se a uma pessoa que gosta de ler, que gosta de livros, que gosta de autores, ou seja, que gosta da literatura em geral. Poderia escolher uns dos meus livros, pois, gosto de pensar neles e nos conteúdos que trabalhei em cada um deles, uma vez que têm muito de mim. Nesse caso, seria o Xenotrófico, o último romance que publiquei na Amazon, que penso ser uma história extraordinária, nunca iria cansar-me de lê-la. Poderia falar dos grandes clássicos da literatura, uma mais valia em termos de entretenimento e aprendizagem para qualquer leitor, lembro-me de Moby Dick, de Herman Melville, uma aventura notável e educativa para qualquer pessoa. Mas falando de dois livros que gostei de ler ultimamente, que me deram perspetivas diferentes sobre a vida e sobre o Mundo, foi o Bibliotecário, de A. M. Dean, e o Silo, de Hugh C. Howey, duas histórias que acrescentaram algo de novo em mim. Um livro para o resto da vida é um campo aberto, com várias opções e algumas incertezas. Valha-nos o prazer da leitura com o livro que seguramos entre mãos em cada momento e nos deliciarmos com as tramas do seu enredo.

O que podem os leitores esperar de ti no futuro?
O que eu espero de mim é deixar uma grande obra literária, vasta, diversa e marcante para os leitores. Gosto de fazer experiências, inclusive literárias, não tenho medo de arriscar, e espero vir a escrever histórias desde o mais banal até ao mais extravagante. Quando escrevo uma história, escrevo-a para mim, para que me agrade, depois, tenho a esperança de que venha a proporcionar uma boa experiência literária a alguém, e assim será, enquanto tiver tempo e condições para escrever.
Um autor deve escrever para si, coisas do seu agrado, e deixar que sejam os leitores a encantarem-se ou desagradarem-se com os seus textos. Cabe ao autor escrever, e ao leitor escolher os autores que mais lhe agradem. Nunca o contrário. Não penso muito no que os outros esperam de mim, simplesmente, procuro fazer o melhor que posso com os recursos que tenho, com vista a concretizar os meus sonhos. Assim se vive e se vai ao encontro da felicidade.

Descreve-te numa palavra:
Consigo caracterizar um objeto ou um animal irracional com uma única palavra. Agora, um ser humano não, é um ser com uma mente muito complexa e detentor de estados emocionais variáveis em função das circunstâncias e do tempo. Uma palavra é algo demasiado redutor para caracterizar devidamente um ser humano, eu não consigo fazê-lo para ninguém, muito menos para mim mesmo. Caracterizo-me como uma pessoa prática, direta, confiável, disciplinada, determinada, que tem os pés no presente e a cabeça no futuro, e penso que isto está patente na obra literária que tenho vindo a publicar. Mas, em termos literários, impessoais, resumindo o meu trabalho numa única palavra, talvez escolhesse “SENTIDO”, pois, bem ou mal, procuro dar sentido a tudo quanto escrevo.