E a vida
deu-lhe uma valente bofetada.
Não foi
forte o suficiente, mas acordou-o para a minha realidade que hoje não
lhe pertence.
Nunca
escrevi por ti nem para ti, ou por nós nem para nós.
Não
foste tu que me tornaste no que sou, só porque foste o primeiro a
quebrar-me, mas aqui estou, a provar-te que nunca dependi de ti.
Quando
recuo às minhas primeiras memórias, vejo uma menina sentada no
jardim das traseiras da casa dos seus avós, de caderno sobre os
joelhos e caneta na mão, a gatafunhar príncipes encantados que ela
sempre soube que não existiam.
Nunca
escrevi sobre amor por acreditar no homem perfeito.
Escrevia
porque acreditava no amor. E acreditava que um dia ele chegaria até
mim.
Liberto-me
de mim mesma, todos os dias.
Quando
escrevo e reescrevo sobre um amor que nunca vivi.
Nem
viverei, porque palavras são insuficientes para falar do amor dos
amantes.
Mas eu
escuto-os.
Eles
falam. Do que não sabem.
A vida
deixou-me cair vezes sem conta.
Mas por
mais partida que esteja, e por mais rasteiras que me passem, haverá
sempre alguém.
A
descobrir a mulher por detrás das palavras que nunca conseguiste
entender.
Mais do
que aqueles que nos arrancam pedaços, cuja existência, nos era até
então desconhecida.
Mais dos
que os cortes e os gritos.
Mais dos
que as paredes cheias de nada.
Mais do
que o meu corpo meio vivo.
Mais do
que as noites em que me deixei morrer.
Porque
fui eu que me matei.
Nunca os
outros, sempre eu.
E estou
ciente disso, é por isso que escrevo.
Não
porque não goste de me ver viva, mas porque sentir-me morta é a
forma mais fácil de continuar a escrever.
Estou de
alma cheia e peito vazio. Dorida, massacrada e farta.
Inspiro
o veneno que os outros expiram.
No final
da rua, há alguém, há sempre alguém que me diz o quão bonito as
coisas podem ser futuramente, mas eu vivo o agora.
Quem me
dera que me pudesses ver hoje a sorrir.
Não ao
lembrar-me de ti.
Mas ao
lembrar-me de como uma pessoa cheia de nada, pode deixar-se esvaziar
ainda mais.
Sobre
nós, espero que saibas: escrevi-te um poema.
Sobre
duas pessoas que se amaram muito.
Mas uma
delas partiu.
E a outra
aprendeu que amar demais é deixar-se partir.
Letícia Brito
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