As pessoas são caixinhas de surpresas. Nunca sabemos com o que contamos. À superfície, todas parecem iguais. Algumas mais calmas. Outras mais intempestivas. No entanto, por debaixo da pele, há segredos que desconhecemos. Histórias que nunca foram contadas. Gritos que foram calados. Sonhos que foram assassinados. Há dores que nem imaginamos. Outras que julgamos conhecer. Há amores que o tempo fortaleceu. E outros tantos que caminharam sobre a linha delicada entre a mágoa e o esquecimento. Tantos refúgios que habitam debaixo da pele. Lugares que não mostramos a ninguém. Lugares de acesso restrito. Alguns lugares, guardados para quem amamos. Às vezes, como uma borboleta que se vai soltando do casulo, também nós, vamos abrindo o peito, rasgando a pele e expondo os demónios e os anjos que nos habitam por dentro. Mas nunca permitimos a metamorfose completa, por medo dos olhares alheios, dos julgamentos daqueles que nem sequer nos conhecem, por vergonha, culpa, ressentimento. Tantas vezes. Há tanto que o mundo precisa de ver e conhecer, mas escondemos. Às vezes, não somos aquilo que as pessoas esperam de nós, somos presentes que elas desembrulham e pelos quais nem esperavam, presentes aos quais torcem o nariz e agradecem por obrigação. Às vezes, somos a sorte grande, o totoloto - não literalmente, não no sentido pejorativo - somos o que o outro tanto procurou, somos o sonho tornado real. É que embora sejamos iguais à superfície, debaixo da pele somos pólos magnéticos opostos. Não existem duas pessoas iguais. E a beleza das relações - sejam elas amorosas, de amizade, entre pais e filhos ou irmãos - está no facto de duas pessoas diferentes, serem capazes de se encaixarem, de fazerem dos pontos negativos que os separam, a ponte que os une, que os completa.