T. M. Grace, seja bem-vinda à nossa rubrica Veia de Escritor, na qual promovemos entrevistas inéditas com autores nacionais, e cujo propósito primordial é fazer com que as suas palavras alcancem novos leitores.

Para começarmos, eis a pergunta que se impõe, como é que nasceu o gosto pela escrita?

R.: O gosto pela escrita nasceu em muito tenra idade. Como necessidade de catarse pelas emoções algo conflituosas, pelo sofrimento, pela violência física, pela solidão. A escrita foi imensas vezes vezes a minha companheira de luta, de viagens, o motor para a realização de muitos dos meus sonhos e o percurso que me trouxe até onde estou hoje, já com vários livros editados em diversos gêneros literários.

Sabemos que trabalha em design e também é terapeuta. Esta realidade teve algum impacto na sua escrita?

R.: Sim, claro. A área de design proporciona-me experiência e criatividade para ilustrar as minhas obras infantis, posso aplicar diversas técnicas e sou muito autodidata também, gosto de experimentar novos conhecimentos que vou adquirindo ao longo do meu percurso profissional e claro quanto mais treinamos a criatividade, mais ela se faz presente na nossa vida e das mais variadas formas.

A área das terapias trouxe-me uma bagagem emocional muito diferente do que eu possuia, conhecer pessoas novas com realidades muito diferentes da minha, conhecimento de outras vidas, de outras histórias e experiências.

Fez-me ver a vida com um novo olhar, fez-me perceber que nem tudo é tão linear quanto parece. Que uma história pode ter vários contornos, várias nuances, dependendo do ângulo em que ela é observada e que não somos ninguém para julgar a vida, as decisões e as ações de outro ser humano, porque simplesmente não passámos o que aquela pessoa passou,  não percorremos o mesmo caminho, nem sentimos na nossa pele a dor pelo que o outro passou. É essa empatia enquanto pessoas que nos vai trazendo a sensibilidade de nos colocarmos no lugar do outro em vez de apontarmos logo o dedo para julgar. De facto o trabalho como terapeuta fez-me evoluir, amadurecer, fez-me ver a vida de uma forma mais abrangente e talvez tenha sido isso que me levou a escrever o meu novo livro infantil, lançado no final de maio, "O Outro Lado da História - Eu e a Menina da Capa Vermelha". Acho que quanto mais cedo as crianças tomarem o contacto com esta realidade, melhor. Elas de "fabrica" já são altruistas, amorosas, têm compaixão, mas conforme vão sendo formatadas com tudo aquilo que se passa à volta delas,  essas características que fazem delas verdadeiros seres humanos, de alma e coração, podem perder-se, ou ficarem escondidas. No meu entender é importante que a literatura infantil além de os fazer sonhar, os faça relembrar esses valores.

As terapias fizeram-me perceber que grande parte do sofrimento do adulto vem precisamente, lá do tempo em que ele um dia foi uma criança. Tudo o que acontece a uma criança, na perceção dela e bastante ampliado. Daí ser também muito importante para mim escrever literatura infantil, mas adoro escrever romance e o livro "Ao Alcance de um Click" é para mim uma obra muito especial.

Há a tendência para se acreditar que um escritor escreve sobre si, o que, na maioria das vezes, não é verdade. No entanto, a sua escrita é meramente ficcional ou inspirada nas suas vivências?

R.: Não vou dizer que nunca escrevi nada baseado nas minhas vivências, até porque mesmo que seja uma experiência de outra pessoa, ou histórias que ouvi de outras pessoas, foram pessoas que se cruzaram comigo para eu as ajudar em alguma altura das suas vidas ou simplesmente se aproximaram porque precisaram de um ombro para chorar, para eu simplesmente as ouvir ou aconselhar, senão não teria estado em contacto com essas vivências, por isso considero essas vivências minhas também. Mas no que escrevo, há muito de ficção, diria até que a maior parte é ficção. Experiências que nunca vivenciei, ouvi ou presenciei, lugares que nunca visitei...Mas na verdade, até gostava 😀 

Publicou Ao Alcance de Um Click, um livro de muito sucesso. Pode falar-nos um pouco sobre este título?

R.: Penso que o sucesso deste livro está relacionado com o fato de ter como pano de fundo um cenário bastante atual, de ter muito a ver com a nossa realidade, de ser uma doas formas como a maoria de nós se relaciona hoje em dia. Pelo fato da internet e redes sociais terem um papel importante na nossa vida, precisamente por conta da pandemia, onde a maior parte das nossas interações sociais durante o tempo de confinamento se fizeram à distância pela internet.

Também porque algumas das histórias são espelhadas na vida de pessoas reais e que possivelmente muitos de nós já pode ter passado por situações muito parecidas, ou conhece alguém que já passou por algo idêntico.

Como surgiu a ideia para a escrita desta obra?

R.: Precisamente porque muitas das histórias que me chegaram às mãos no exercício da minha profissão como terapeuta, tinham sempre algo idêntico no que respeita a algumas experiências, tal como as pessoas conhecerem-se e relacionarem-se via online, os problemas que surgiram à posteriori,  as manipulações psicológicas e tantas outras coisas. Confesso que a ideia depois surgiu-me derepente, inclusive o título para o livro, aliás o surgimento dos títulos de todas as minhas obras, surgem sempre de forma expontânea e intuitiva.

Quais são os seus projetos para o futuro? Os leitores poderão contar com novas obras e dentro do mesmo registo ou prepara algum desafio?

R.: "Ao alcance de um Click" tem continuação. Será contado o melhor e  o pior de muitas histórias, ou seja, a Teresa que é a protagonista, terá ainda muitos desafios pela frente.

Tenho também um novo romance a sair brevemente.

Romance esse que tocará em temas bastante sensíveis.

Mostrará a outra face do ser humano, porque sinto que tenho uma missão enquanto escritora, que é mostrar o que realmente acontece para lá da bolha em que muitos de nós vive. Há Coisas que nem imaginamos que acontecem, porém infelizmente fazem parte da realidade de muitos seres humanos e se eu puder "denunciar" o que acontece nos bastidores, trazer à luz o que está nas sombras, eu assim o farei.

Espero que a Oficina da Escrita, na altura certa, aceite em primeira mão, fazer a crítica literária desta minha nova obra.

E claro, mais livros infantis.

Qual a mensagem que gostaria de partilhar com quem nos está a ler?

R.: Gostaria de dizer que encontrem formas de se fazerem ouvir.

Encontrem maneiras de se expressarem, seja pelas artes, pela escrita, pelo amor, altruísmo e compaixão, seja de que forma for...

Se acham que há coisas a mudar no mundo, há que mudá-las primeiro em nós e consequentemente, aos poucos as coisas à nossa volta também mudarão, afinal até o mais fraquinho dos susurros pode ser ouvido se realmente o quisermos ouvir e estivermos atentos, porque aquilo que as coisas "mais vergonhosas" que acontecem no mundo querem, é precisamente continuarem na sombra.

Porque a partir do momento em que são expostas à luz , em que são descobertas, elas deixam de ter poder, ou pelo menos deixam de poder operar tranquilamente, como o faziam antes de serem descobertas. Tudo o que opera na sombra, é porque tem algo a esconder, tal como "o submundo das drogas e do crime", "a dark web" e por aí fora...

Façam ouvir as vossas vozes, tendo como eco de sabedoria uma das frases máximas e que eu mais gosto e que para mim faz todo o sentido, que é: "O que me preocupa não é o grito dos maus, mas o silêncio dos bons".

Boas leituras!