Esta é uma imagem meramente ilustrativa, associada ao pseudónimo.
Esta é uma imagem meramente ilustrativa, 
associada ao pseudónimo e cedida pelo autor.

Carlos, sê bem-vindo a este espaço. É um gosto poder conhecer-te melhor e apresentar-te aos seguidores deste espaço, para começar: Como é que te iniciaste na escrita? Descobri o prazer da leitura já numa fase tardia da minha juventude. Mas foi o início de uma descoberta de mim mesmo e uma forma de complementar a minha paixão pelas viagens. Adoro viajar, quer fisicamente… em trabalho e/ou lazer, assim como adoro viajar para onde as palavras me levam. Entretanto, com isso das viagens – como ainda sou do tempo em que havia mundo sem internet – escrevi [talvez] largas centenas de cartas. Adorava a comunicação envolvida nesse processo de escrita. O colocar uma parte de nós dentro de um envelope e receber parte de outros pelo mesmo processo. Foram esses os meus primeiros escritos, que ainda guardo… como imortais conversas desfasadas com pessoas importantes na minha vida. Como muitos comecei a andar com uns caderninhos pretos atrás de mim, onde ia registando algumas ideias do que ia lendo, do que ia sentindo e fui amadurecendo e agravando o meu gosto pelo estupefaciente que é a poesia.

São inúmeros os sentimentos que nascem no âmago do escritor. Quais aqueles com que mais te identificas? Eu tenho uma verdadeira paixão pelo tão nosso [F] Pessoa e pela [F] Espanca. São duas das maiores influências no meu sentir e, por isso, julgo-me mais próximo da escrita que retrata o desespero que exacerba o querer, a saudade, a dor… numa constante ode ao amor. Fui conspurcado posteriormente pelas influências estrangeiras de Henry Miller e Charles Bukowski, onde comecei a ficar com uma escrita mais rebelde, perturbada… carnal.

O que é que a escrita mudou em ti, enquanto pessoa? A escrita mudou-me no sentido de me tornar [de]mais solitário e [de]menos intransigente com a [minha] vida. É um refúgio do caos e velocidade terminal com que [sobre]vivemos. É também uma forma de eu poder dizer tudo aquilo que me vai na alma, mas que nunca contei.

E enquanto escritor, o que tens aprendido? Aprendi que devia ter prestado mais atenção nas aulas de Português, pois deparo-me com uma [muitas vezes] difícil gestão da ortografia, gramática e sintaxe. Nas poucas vezes que me obrigo a ler o que escrevo, chego a ficar dececionado com a pobreza do meu Português e por isso tenho alguma dificuldade em identificar-me como escritor. Chego a achar isso ofensivo para quem realmente escreve. Considero-me um autor, abusador dos duplos sentidos e [des]construtor das palavras.

Como definirias a escrita na tua vida: um passatempo, uma necessidade ou um acaso? Diria que me enquadro nas três opções, mas exatamente pela ordem inversa com que surgem na questão. A escrita, começou por um acaso, e rapidamente se tornou uma necessidade em forma de vício recreativo, deste tão fundamental passatempo criativo.

Publicaste o teu primeiro livro Escrever(nus), em 2019. Podes falar-nos um pouco sobre este livro?  O Escrever(nus) surgiu como uma primeira experiência, uma descoberta e uma ode ao Amor e à Paixão. Rebocado um pouco no conceito poético de um dia escrever um livro, ter um filho, plantar uma árvore… sempre esteve presente em mim essa vontade, e sempre foi algo que ambicionei deixar como exemplo e herança. Embora escreva sobre anonimato e poucas pessoas saibam desta minha vertente, totalmente antagónica com o que é a postura que usualmente sou reconhecido no seio familiar e profissional, conto um dia… [talvez]… revelar e entregar esse legado aos meus filhos. Por detrás do homem de sorriso difícil que me tornei, existe ainda um menino que sonha atrás do brilho do olhar, que poucos [re]conhecem. O Escrever(nus) é um [a]Teu acto de fé, carnal, vicioso e pecaminoso [n]um acreditar que mais do que uma relação entre corpos, somos seres conectados por sentires para além do físico.

O que te inspirou a escrevê-lo? Fui inspirado pela lua, e por todas as cartas e decisões que tomei sobre ela. Toda a minha vida erigida sobre esse altar. Por isso… Mahina. Como ser notívago que sou, e tendo grande partes dos textos sido escritos pela noite dentro, onde tinha a companhia da minha solidão, em inflamados debates [des]motivados de fundamentação. Procurei respirar sentires… e chorar dores, em formas de lágrimas escondidas que lavam/levam…e [por vezes] curam.

Podes partilhar connosco um pouco daquela que tem sido a tua experiência no universo literário? Tem sido uma montanha russa de emoções. Se por um lado é desafiante e tem-me feito participar em alguns concursos e Antologias… e é tão boa a sensação de pegar num livro que nos contém. O cheiro do papel… é [peculiar… tão só] nosso. Não tenho objetivo de me tornar literário, ou de publicar muitos livros. Mas gosto do timbre dessa mesma expectativa, que não o é. Por outro lado, a divulgação dos textos online, principalmente na pagina do Facebook, tem criado algumas situações menos agradáveis, com alguns bloqueios por denúncias e por existir algum desentendimento com o principal objetivo da minha [d]escrita, assim como a opção pessoal de manter a mesma sobre o anonimato de um pseudónimo.

Como têm reagido os leitores face ao teu trabalho? Tem sido muito positivo o retorno de quem me lê. A grande maioria gosta do «diferente» da forma como [d]escrevo. É motivo de orgulho pessoal, conseguir fazer sentir o que para mim faz e é sentido. 

Adaptas-te com facilidade aos diversos géneros literários ou preferes manter-te apenas no teu registo habitual? Gosto de experimentar coisas novas, desafiar-me, mas a verdade é que sou de extremos, quando gosto, gosto muito. Quando não gosto… também não vale sequer a pena tentar. Sou demasiado orgulhoso para [a]ceder facilmente. Por [muito mau] feitio, sou perentório a permanecer e repetir tudo o que gosto muito, seja um prato de comida favorito, uma música, um livro… o Amar de uma vida. Assim, gosto muito do meu registo habitual, pelo que não me revejo em grandes mudanças de géneros literários.

Se só pudesses ler apenas um único livro para o resto da tua vida, qual seria o privilegiado? É uma escolha difícil e ingrata, quase como ter que escolher um filho do qual gostamos mais. Diria que assim numa decisão rápida, talvez o Livro do Desassossego, de Fernando Pessoa.

Se tivesses de escrever num género diferente, a qual desafio te proporias? Gostava de um dia escrever um romance de época. Tentar escrever sobre personagens de outros tempos, fora do seu tempo.

O que é que os leitores podem esperar de ti para o futuro? Não sou particular adepto de futurologia e o planeamento que me obrigo por razões profissionais é o máximo de expectativas que tento gerir. Em relação à escrita, tenho a certeza que ela irá sempre existir nos meus dias. Não garantidamente sobre um constante vislumbre comercial, pois não me parece que seja para mim possível e objetivo nesta conjetura, viver da cultura das palavras. Claramente vivo com as palavras, mas, infelizmente, não penso ser possível viver da escrita. Gostava de um dia de ganhar a lotaria e comprar uma casa nos Açores, tornando-me insular e vivendo a paixão de uma vida. Como o meu vicio é a escrita… e não o jogo… não vejo a sorte mudar.

Descreve-te numa palavra: Polifacetado.